A nova ordem executiva do presidente dos EUA, Donald Trump, que orienta os departamentos de Estado e do Tesouro a buscarem designações de terrorismo para capítulos específicos da Irmandade Muçulmana representa uma das mudanças mais significativas na política dos EUA em relação ao movimento em décadas.
Assinada em 24 de novembro de 2025, a ordem inicia a primeira revisão formal das filiais da Irmandade no Egito, na Jordânia e no Líbano sob as leis de designação dos EUA e redefine como Washington lida com movimentos islâmicos que possuem alas políticas e militantes.
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O senador Ted Cruz, republicano do Texas, elogiou a medida, chamando-a de essencial para a segurança nacional. “A Irmandade Muçulmana e suas filiais incentivam, facilitam e fornecem recursos para o terrorismo jihadista em todo o mundo”, disse ele, instando o Congresso a avançar com sua Lei de Designação de Terrorista da Irmandade Muçulmana de 2025.
De acordo com o Fox News, Washington debate há muito tempo se a Irmandade é um movimento global unificado ou uma rede frouxa de filiais nacionais com agendas e níveis de militância diferentes. Essa disputa paralisou tentativas anteriores de designar o grupo. A ordem de Trump contorna esse debate e direciona agências federais a examinarem capítulos individuais que, segundo analistas, já atendem aos critérios legais.
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Mariam Wahba, analista de pesquisa da Fundação para a Defesa das Democracias, afirmou em um comunicado que a diretiva “substitui anos de debate por ação concreta” e força as agências dos EUA a avaliarem entidades da Irmandade que funcionam como “organizações reais com estruturas de liderança, canais de financiamento e laços documentados com grupos terroristas”. Ela disse que a ordem “trata atores islâmicos de acordo com seu comportamento, não com sua marca”.
Em todo o mundo árabe, a Irmandade foi banida há anos. O Egito a proibiu em 2013, após acusá-la de radicalização e esforços para minar instituições estatais. A Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos a designaram logo depois, chamando-a de ameaça direta à estabilidade nacional. O Bahrein emitiu conclusões semelhantes. A Jordânia dissolveu sua filial local neste ano, após prisões ligadas a atividades com armas ilícitas. A Áustria também tomou medidas legais contra redes ligadas à Irmandade como parte de sua estrutura de combate ao extremismo.
Autoridades nesses países afirmam que a Irmandade usa uma mistura de pregação religiosa, ativismo político, instituições de caridade e plataformas de mídia para moldar a opinião pública e desafiar a autoridade estatal.
No Ocidente, a Irmandade opera com muito mais liberdade. Nos Estados Unidos, organizações ligadas à Irmandade funcionam por meio de instituições de caridade, centros de advocacia, mesquitas, associações estudantis e grupos comunitários. Essa abertura levantou preocupações entre autoridades de contraterrorismo, especialmente após uma investigação federal dos EUA no início dos anos 2000 descobrir um memorando interno da Irmandade descrevendo seu trabalho na América como um esforço de longo prazo para influenciar e enfraquecer instituições ocidentais de dentro para fora.
Um relatório encomendado pelo governo da França no início deste ano alertou sobre a influência da Irmandade no país, mas Paris ainda não implementou uma proibição oficial.
O documento, de acordo com pesquisas do think tank Mind Israel, reflete a crença da Irmandade em “influência social de longo prazo” por meio de educação, redes de bem-estar e mídia.
O movimento foi fundado em 1928 por Hassan al-Banna no Egito, após o colapso do Império Otomano. A Irmandade promoveu o Islã — segundo especialistas — como solução para crises políticas modernas e dependeu de divulgação, serviços e mídia para expandir sua base. Pensadores influentes como Sayyid Qutb mais tarde inspiraram movimentos jihadistas, como a Al Qaeda e o grupo Estado Islâmico.
Embora a Irmandade historicamente mantivesse um “guia geral” simbólico no Egito, o movimento agora opera como uma rede descentralizada no Oriente Médio, África, Europa e América do Norte. Wahba observou que essa fragmentação explica por que tentativas anteriores dos EUA de impor uma designação geral falharam. Em vez disso, a ordem de Trump adota o modelo usado quando os Estados Unidos designaram o Hamas, a filial da Irmandade em Gaza, em 1997: mirar nos componentes “que se envolvem em violência, não na ideologia em si”.
A decisão também surge em meio a crescentes preocupações israelenses sobre um bloco islâmico ressurgente apoiado pela Turquia e pelo Catar. O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, elogiou publicamente a ação de Trump, chamando a Irmandade Muçulmana de “uma organização que ameaça a estabilidade em todo o Oriente Médio e além”, e disse que Israel pretende expandir suas próprias restrições.
Avner Golov, vice-presidente do Mind Israel, argumentou que os Estados Unidos deveriam combinar o novo processo de revisão com passos para confrontar a influência estrangeira na academia americana, condicionar acordos de armas a mudanças de comportamento e fechar brechas exploradas por organizações ligadas a extremistas.
À medida que os departamentos de Estado e do Tesouro começam a montar arquivos de evidências, autoridades afirmam que o objetivo não é uma proibição geral, mas um processo legal direcionado baseado em laços comprovados com o terrorismo. Analistas dizem que os resultados podem determinar como os Estados Unidos confrontam um movimento banido em todo o Oriente Médio, mas ainda ativo nas sociedades ocidentais.
Efrat Lachter é uma repórter investigativa e correspondente de guerra. Seu trabalho a levou a 40 países, incluindo Ucrânia, Rússia, Iraque, Síria, Sudão e Afeganistão. Ela é recipiente da Bolsa Knight-Wallace de Jornalismo de 2024. Lachter pode ser seguida no X @efratlachter.









